Análise em Profundidade: A guerra tarifária da era Trump – acordos, tensões e desafios para o Brasil


A guerra tarifária promovida por Donald Trump moldou intensamente a dinâmica do comércio internacional recente. Desde a imposição de tarifas agressivas sobre parceiros tradicionais até negociações que resultaram em acordos considerados amplamente favoráveis aos Estados Unidos, o ambiente global de negócios passou por transformações profundas, afetando grandes players como União Europeia, Japão, China e, mais recentemente, o Brasil. Neste artigo, analisamos as principais frentes dessas negociações, incluindo os detalhes mais atuais de cada acordo e o impacto sobre as perspectivas brasileiras.
O acordo EUA-União Europeia: vitória norte-americana
Após meses de tensão e ameaças concretas de um tarifaço de 30% sobre produtos europeus, os Estados Unidos e a União Europeia anunciaram recentemente um acordo que pôs fim à crescente animosidade tarifária. A UE aceitou um imposto de 15% sobre a maioria de seus bens exportados para o mercado americano—bem abaixo do patamar que Trump chegou a ameaçar implementar, mas ainda assim substancial para vários setores europeus, como automóveis, farmacêuticos e semicondutores 1 2 3.
Em contrapartida, os Estados Unidos conquistaram uma ampla abertura do mercado europeu para exportações americanas com tarifa zero em produtos selecionados, o compromisso europeu de investir centenas de bilhões de dólares em energia e equipamentos militares americanos e a promessa de aquisição anual adicional de US$250 bilhões em energia dos EUA até 2027. Para a indústria norte-americana, especialmente nos segmentos de agricultura, energia e defesa, trata-se de um resultado extremamente benéfico, consolidando acesso privilegiado e previsibilidade nos fluxos de exportação, enquanto mantém tarifas elevadas em setores sensíveis para os europeus 1 3 4.
O acordo, saudado como “o maior já feito” por Trump, foi criticado dentro da UE como uma capitulação forçada pelas circunstâncias, já que o bloco preferiu absorver custos a arriscar uma guerra comercial total contra seu maior parceiro econômico externo 2 5.
O acordo com o Japão: reciprocidade e vantagens para os EUA
Outro grande triunfo anunciado pelo governo Trump foi o tratado comercial com o Japão, alcançado às vésperas do prazo que previa a elevação unilateral de tarifas americanas de 25% para 15% sobre importações japonesas 6 7 8 9.
O núcleo do acordo está na aplicação de tarifas “recíprocas” de 15% sobre bens japoneses vendidos nos EUA e o anúncio de um pacote de investimentos de US$550 bilhões do Japão no território americano. Além disso, o Japão se comprometeu em ampliar significativamente a importação de veículos, arroz e produtos agrícolas americanos, além de adquirir 100 aeronaves Boeing. Embora o acordo também sinalize abertura de mercado japonês para setores estratégicos dos EUA, as tarifas mantidas ainda representam obstáculos para a indústria nipônica, sobretudo diante da pressão popular interna e da conjuntura de custos crescentes no país asiático 6 7 8 9.
Trump comemorou a conquista dizendo que “os Estados Unidos ficarão com 90% dos lucros”, embora detalhes sobre o funcionamento desse cálculo ainda careçam de mais transparência.
China: trégua tensa e cenário incerto
A relação comercial EUA-China continua sendo o palco mais complexo da guerra tarifária. Em 2025, após sucessivas escaladas desde o segundo mandato de Trump, os dois países assinaram um acordo em Genebra prometendo redução das tarifas para 10% (após um pico anterior de 145%), em meio à sobreposição de tarifas múltiplas—de segurança nacional, retaliação, setorais e antidumping—que ainda mantêm o peso médio para produtos chineses acima de 30% 10 11.
Pontos principais do novo acordo incluem:
- Compromisso da China em facilitar a exportação de “rare earths” e outras commodities estratégicas para os EUA, em troca da retirada de várias medidas restritivas impostas por Washington.
- A manutenção de tarifas agregadas de até 55% sobre vários produtos chineses, combinando tarifa base, sobretaxas antidrogas (fentanil), e “Section 301”, além de manter setores estratégicos, como aço e alumínio, altamente protegidos nos EUA 10 11 12.
- China manteve taxas médias de 32,6% sobre importados americanos. A estrutura dos acordos é complexa e cheia de exceções, gerando incerteza quanto à estabilidade da relação no médio prazo 10 11.
O resultado é uma trégua aparente, renovada por períodos de 90 dias, com acordos parciais e promessas de revisão, mas sem uma solução definitiva para as disputas de fundo. O comércio entre os dois gigantes, segundo análises recentes, deve cair cerca de US$485 bilhões até 2027, refletindo os persistentes entraves tarifários e não tarifários 13 12.
O Brasil e o “tarifaço” de 50%: desafios e expectativas
Enquanto Trump celebrou sua assertividade tarifária junto aos grandes blocos internacionais, o Brasil entrou na mira da guerra comercial em julho de 2025. Em carta enviada ao governo brasileiro, Trump anunciou uma elevação de até 50% nas tarifas sobre bens brasileiros exportados aos EUA a partir de 1º de agosto, como resposta a supostas perdas comerciais acumuladas pelos americanos e conflitos extraeconômicos, como denúncias contra o ex-presidente Jair Bolsonaro 14 15.
A resposta do governo Lula foi firme: prometeu retaliação proporcional caso os EUA mantenham as medidas, e apresentou um plano de contingência para mitigar os danos às empresas nacionais. Segundo o Ministério da Fazenda, estão previstas medidas de alívio e compensação para setores mais afetados, como aeronáutica, energia e insumos industriais, que dependem fortemente do mercado norte-americano 16 17.
Até o momento, a perspectiva de reversão do tarifaço ainda é incerta. O Brasil articula junto à OMC e com parceiros do BRICS por pressão contra a medida, mas a disposição do governo norte-americano em negociar alívios imediatos é limitada. Espera-se que, caso seja mantida a pressão internacional e se demonstre impacto negativo sobre a própria pauta agrícola e de insumos americanos, abram-se fissuras para uma negociação que reduza as tarifas a níveis negociados, como ocorreu na UE e Japão.
Considerações finais
A guerra tarifária liderada por Trump não apenas redefiniu prioridades geoeconômicas globais, mas também inaugurou uma nova era de incerteza, barganha de alto risco e acordos bilaterais amplamente direcionados pelos interesses americanos. Com a União Europeia e Japão, os Estados Unidos arrancaram concessões extraordinárias. Com a China, caminham para trégua, mas sem resolver as causas estruturais do conflito. O Brasil, agora na berlinda, tenta encontrar espaço para negociação, ao mesmo tempo em que prepara sua economia para lidar com o tarifaço imposto.
O cenário internacional, assim, permanece volátil e sujeito a recalibrações bruscas, onde o pragmatismo agressivo define os rumos do comércio. A expectativa é que, à medida que as consequências desses acordos se tornem mais evidentes—para a economia global, para o emprego e para a soberania dos países—novos atores e arranjos surjam para contrabalançar a pressão tarifária imposta pelos EUA nos próximos anos 1 3 10 14 15 16 13.
Assessoria Cidadão Alerta
Fontes:
- https://www.bbc.com/news/articles/cx2xylk3d07o
- https://www.cnn.com/2025/07/28/business/eu-us-trade-deal-capitulation-intl
- https://www.aljazeera.com/economy/2025/7/28/eu-and-us-announce-deal-a-breakdown-of-the-trade-agreement
- https://finance.yahoo.com/news/live/trump-tariffs-live-updates-us-eu-deal-details-emerge-as-china-talks-begin-trump-seeks-15-20-world-tariff-200619425.html
- https://www.nytimes.com/2025/07/29/world/europe/europe-trump-trade-concessions-analysis.html
- https://www.cnn.com/2025/07/22/business/japan-trade-agreement-us
- https://www.bbc.com/news/articles/cpwq4dljjdko
- https://www.newsweek.com/trump-japan-trade-deal-tariffs-diet-ishiba-2103948
- https://www.reuters.com/business/trump-strikes-tariff-deal-with-japan-auto-stocks-surge-2025-07-23/
- https://www.china-briefing.com/news/us-china-tariff-rates-2025/
- https://www.piie.com/research/piie-charts/2019/us-china-trade-war-tariffs-date-chart
- https://www.reuters.com/world/china/us-china-tariff-truce-holds-now-us-says-trump-has-final-say-2025-07-29/
- https://www.cnbc.com/2025/07/28/chinese-trade-to-us-could-drop-by-485-billion-tariff-simulator.html
- https://www.cnn.com/2025/07/09/economy/tariff-letters-trump
- https://www.opeu.org.br/2025/07/29/a-short-note-on-the-us-threat-of-tariffs-on-brazil-gatt-rules-and-brics/
- https://www.reuters.com/business/aerospace-defense/brazil-is-planning-relief-measures-firms-hit-by-us-tariffs-says-minister-2025-07-29/
- https://agenciabrasil.ebc.com.br/en/economia/noticia/2025-07/lula-receives-contingency-plan-us-tariffs
- https://www.reuters.com/business/us-eu-avert-trade-war-with-15-tariff-deal-2025-07-28/
- https://www.whitehouse.gov/articles/2025/07/what-they-are-saying-landmark-u-s-eu-trade-deal-is-another-big-win-for-americans/
- https://www.politico.com/news/2025/07/28/trump-tariffs-trade-unclear-eu-japan-00480793